Um dia (já faz tempo) uma mulher me surpreendeu com olhos muito atentos. Tinha um rosto espantado e insistia em me olhar. Acho que queria apalpar-me com os olhos. Foi quando percebi que, como num momento de fecundação, eu saltava para dentro de uma forma e me tornava definitivamente visível, tocável, como qualquer corpo existente. Este porte", ela disse, "esta tez", pronunciou ela com uma voz oracular e um olhar que, me dando peso, cor e luz, finalmente me fisgava da falsa modéstia e sobretudo da vontade reprimida dos afetos. Alguém, na ocasião, me falou em feitiço. De fato, só um mecanismo mágico poderia conferir-me aquele salto do informe e do possível para o vigor do corpo em estado de vida. Aquele olhar e o percurso misterioso até as palavras pronunciadas evocavam aquele gesto definitivo com que um poeta, ao conferir existência as suas criaturas, cativa-as numa trama de sortilégios. Lembrei-me dessa experiência intima (que, com algum pudor exponho aqui), em todos os momentos da leitura deste livro de Maria Lúcia, durante a qual me identifiquei com os objetos, quadros, flores, frutos, retratos de mulher com leques, boás ou guarda-sóis. É uma poesia que ousa indicar, sob o tecido insidioso de seus circunlóquios, o que a cada um dos objetos seres em definitivo compete consistir poeticamente. É assim que, no percurso enredado de cada um dos poemas, há um momento em que a palavra se lança, como um arpão, tentando atingir aquilo a que, secretamente reservados nos objetos, o
Peso: | 0,05 kg |
Número de páginas: | 144 |
Ano de edição: | 2021 |
ISBN 10: | 8573211571 |
ISBN 13: | 9788573211573 |
Altura: | 19 |
Largura: | 14 |
Comprimento: | 5 |
Edição: | 1 |
Idioma : | Português |
Tipo de produto : | Livro |
Assuntos : | Poesia e Poemas |
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